quarta-feira, 2 de março de 2011

Tema 23 - Pegação no trabalho

Bolo e Café

Nada mais estranho que a animalidade humana. E nada mais humano...

Certa feita vi um cão, um cão e sua matilha, sua matilha e sua ninhada. Vi o que via em
qualquer esquina, vi o que via em qualquer família de hominídeos. Vi e continuaria vendo pro
resto da vida desde que almejasse que à vida um resto fosse guardado. Via e olhava ao redor.
Desci uma ladeira, o sol a pino me esquentava, fervia minhas espaldas, fui de camisa preta,
diria até no auge da minha alucinação de veraneio que era feita de um preto mais escuro
que os outros, quase uma frigideira de teflon, faltando só o ovo a ser estalado. Caminhei e
caminhei, até chegar à porta do meu escritório.

Meu escritório ficava à Rua Major Diogo, próximo ao minhocão. Muito trabalho
naquele dia chegara à minha mesa, e assim deveria ser, pois eu era o dono, o faxineiro, o
pedreiro, e o executivo mor, e o cara que colocava trabalho na merda da minha mesa naquela
espelunca. Espelunca não! Escritório! Respeito é bom! Essa vizinhança ainda me enlouquece!
Sempre resolvem chamar meu escritório de espelunca. Naquela semana de Janeiro resolvi
diversificar meus negócios, contratei mais free-lancers para atender à crescente demanda que
se revelava apesar da crise. Há coisas, como comer, que não há crise que diminua a demanda,
talvez a oferta, mas a demanda jamais! Aí era onde se inseria meu famigerado afazer.

Trrrrrriiiiimmmm (campainha). Sônia chegou.

- Bom dia Sônia, como está bonita. Porque não passa um lápis nos olhos pra ficar
perfeita?

- Perfeita eu! Quê isso Seu Carlos.

- O trabalho tem dessas coisas minha querida. Quem não almeja a perfeição?

- Assim você me deixa acanhada Seu Carlos.

- Enfim... Tenho trabalho pra você hoje. Quer?

- Rua Aurora 275. Procure por Silvio ou Silvia, são gêmeos. Não vá se confundir heim!

- O devo fazer? O de sempre? Qual dos dois devo privilegiar?

- Mas qual atendo primeiro Seu Carlos?

- Já disse que não faço isso! Gosto de ser valorizada pelo meu ofício, se sair algo err...

- Te pago o dobro - Interrompendo-a.

- Às 23. Leve seu espartilho pras coisas sairem perfeitas. E não se esqueça do lápis!

Saiu e foi se arrumar ainda mais, o espartilho negro combinava com a ocasião. Dois de
uma vez só! Não vou agüentar. Apesar de que uma é mulher, assim poderei penetrá-la com
mais facilidade, normalmente nós mulheres relutamos menos, a fragilidade do corpo nos fez
assim. E de mais a mais estamos mais acostumadas com as dores misturadas ao prazer. Os
gêmeos só ficariam em casa até as 23h15min, era aniversário deles e comemorariam num
boteco no Arouche, caso Sônia não chegasse a tempo o trabalho que teve para pintar os olhos
seria em vão.

Chegou às 23:07, Silvio já estava quase pronto e Silvia colocando a calcinha nova para
a ocasião, provavelmente Diógenes estaria à sua espera no boteco para comemorarem juntos.
Sônia não teve trabalho para arrombar a porta, pois estava aberta. Ao fundo, perto da janela,
Silvio se perfumava, saindo de um quarto à direita Silvia com um pé descalço e o outro a ser
calçado por um sapato roxo de 10 cm de salto precipitou sua presença. Abriu a blusa e o corpo
que habitava aquele espartilho de azeviche somado à estupefação do ato fez de Silvio um ser
inerte, frágil e a primeira vítima. Do seio esquerdo Sônia sacou uma faca afiada, tipo Rambo,
e atacou a uma distância de 5 metros, atingindo o centro da testa, entre os olhos, o 3º olho,
a consciência hindu, Silvio caiu inconsciente. Silvia tentou a fuga, mas Sônia a atingiu com um
golpe de punhal no baço que sacara do outro seio. Silvia foi poupada por alguns instantes,
Sônia deliciava-se com a resistência da dor feminina, mas estava a trabalho e regozijava-se de
seu profissionalismo. Deixou-a ao solo a gemer enquanto retocava a maquilagem no espelho
do banheiro, o lápis estava decomposto, Odeio lápis! Retornou e com um tiro no meio da testa
finalizou com o pouco de vida que restava em Silvia, Silvio moribundo morreria com o tempo.
Bateu a porta ao fundo e despediu-se deixando um pedaço de bolo de laranja e uma jarra de
café no criado-mudo.

- Tome o envelope, deposite na conta do Rio e vá pra Copacabana na terça, lá estará
Sérgio, um outro cliente. Esse é grã-fino, portanto capriche no lápis.

- Puta que pariu Seu Carlos! Detesto lápis!

- Pode me chamar de Carlos Sônia.

- Eu num gosto desse troço no meu olho... Carlos!

- Então não precisa, basta o espartilho, aquele que te dei, não o preto.

Deitaram-se à mesa do escritório, o único lugar não úmido do local. Do espartilho
Sônia sacou dois lindos seios a refletirem a luz fosforescente que deixava a conta mais barata
e se rasgaram as outras peças de roupa. No dia seguinte não se viu Carlos chegar ao escritório,
pois não havia saído. À mesa seca um bolo inteiro de laranja e uma jarra de café mataram a
fome dos investigadores.


Rodrigo Romera

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